Negros saberes africanos já estão mais frequentes na educação básica

Fonte: Fepesp e Jornal da USP

Para especialistas, a inserção dos saberes negros africanos nos currículos escolares é um “trabalho de posicionamento político diário”; educadores contam suas estratégias por disciplina

Celebrando o pertencimento negro, as raízes e heranças, o Dia Nacional da Consciência Negra veio apresentar as populações negras por meio das suas contribuições às sociedades, ressaltando esses saberes ora nas disciplinas escolares, ora transversalmente na sociedade. Para a historiadora Eva dos Santos, graduada pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, a inserção dos saberes negros africanos nos currículos escolares é um “trabalho de posicionamento político diário”.

Como coordenadora pedagógica do Núcleo de Educação para Relações Étnico-Raciais da Secretaria Municipal de Educação do Estado de São Paulo, Eva destaca o papel da formação continuada para a descolonização não só dos currículos escolares, como também do pensamento racista entre os educadores. “Não precisa ser negro para tratar da temática racial. É um assunto que atinge toda a sociedade. Não há um trabalho acabado para lidar com isso, é uma ação contínua, entre elas, os materiais de apoio das Secretarias de Educação das Relações Étnico-Raciais, que não visam privilegiar uma população, mas melhorar a sociedade como um todo acabando com o racismo”, diz a educadora.

Mais transparência – De acordo com a professora Maria da Glória Calado, da Faculdade de Educação (FE) da USP, os mecanismos que devem garantir a aplicação da lei devem ser guiados por transparência, investimento em formação inicial e continuada, estabelecimento de metas mensuráveis e, em especial, pela valorização permanente de docentes que atuam com projetos antirracistas.

Maria da Glória lembra que alguns deles já estiveram em documentos como as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (Resolução 001/04) e no Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, porém devem ser reforçados ou retomados.

A professora também é psicóloga e pesquisadora no campo da educação. Ela estuda as relações étnico-raciais na escola, inclusive com a participação no grupo de pesquisa “Raça, gênero, etnomatemática e culturas afro-brasileiras – relações étnico-raciais e diversidade de gênero na construção de uma epistemologia afro-brasileira e feminista nas escolas públicas de São Paulo”, da USP, e no grupo de estudos e pesquisas “Educação e Afroperspectivas” (CNPq), de natureza interinstitucional.

E entre alguns mecanismos que garantam a aplicação da lei 10.639/03, a educadora sugere, entre outras iniciativas, a criação de grupos de trabalho específicos em secretarias municipais e estaduais de Educação. “Nesse espaço, faz-se necessário ter metas mensuráveis de implementação, formas de monitoramento e fiscalização, além de participação deliberativa da sociedade civil, com universidades, movimentos sociais e associações educacionais”, recomenda.

Ela também destaca a importância da realização de formações específicas com gestores escolares e com os diferentes educadores dentro do ambiente escolar sobre a educação antirracista. Com isso, estará garantida a coordenação adequada e embasada das ações para a educação para as relações étnico-raciais. “Outro ponto importante é a obrigatoriedade da realização de ações contínuas e coletivas no projeto político pedagógico durante o ano letivo”, diz a educadora.